História da Igreja

Erasmo de Rotterdam, Desidério (1467-1536)

Conhecido como “o príncipe dos humanistas cristãos”, recebeu sua primeira educação entre os Irmãos da vida comum em Gouda (Holanda). Depois foi a Deventer, onde estudou a fundo o latim para ingressar mais tarde e fazer seus pri­meiros votos como cônego regular de Santo Agos­tinho (1486). Ordenou-se sacerdote e foi nomea­do secretário do bispo de Cambrai. Praticamente desligado de seus compromissos monásticos e sacerdotais, durante vários anos deslocou-se para Paris (1495), Itália, Oxford, Lovaina, Inglaterra, onde visitou Oxford, e foi o primeiro professor de grego na Universidade de Cambridge (1511­1514). Durante esse tempo observou e estudou os movimentos humanísticos da Europa, criando uma rede de amigos e colaboradores de sua obra. Merece destacar-se a amizade que sempre pro­fessou, desde sua primeira visita à Ilha (1494), a *Tomás Morus. Essa amizade, partilhada pelo inglês, deu lugar a estadas prolongadas de Erasmo em Londres e também a uma colaboração estrei­ta entre ambos os humanistas no campo da tradu­ção. A casa de Morus era o lar de Erasmo, onde escreveu sua famosa obra o Elogio da loucura em oito dias.

 

A partir de 1521, Erasmo mudou-se para Ba­siléia, onde morou na casa de seu impressor J. Froben. Mudou sua residência para Friburgo (1529-1535), e voltou para morrer em Basiléia.

Sua vida e atividade se ambientaram na Euro­pa de seu tempo. Da Europa dessa época, Erasmo se preocupou com a política, a educação, os ho­mens e a religião. De frente para essa Europa que bem conheceu, podemos traçar os temas e pro­blemas objeto de sua preocupação:

a) Começa pelo problema do humanismo em sua primeira acepção: o retorno às letras antigas gregas e romanas. Erasmo encontrou nos mode­los clássicos greco-latinos o modelo perfeito da humanitas. Durante os primeiros anos dedicou­se com paixão e fervor ao estudo do latim e do grego. A leitura, o comentário e a tradução dos autores clássicos serão o passatempo e exercício constante ao longo de toda a sua vida. Leu Homero, de quem “somente ao ver a obra dá-lhe alegria e o devora avidamente com os olhos”. Leu e traduziu Cícero: De officiis (1501); De amicitia (1520); De senectute (1520). A partir de 1509, fez edições de Plauto, Terêncio, Platão, Píndaro, Eurípides etc. Foi leitor assíduo de Sêneca e de Plutarco, de quem fez traduções e comentários. Riu com a graça e a ironia de Aristófanes, Marci­al, Juvenal e, principalmente, de Luciano, seu autor favorito, cujos Diálogos traduziu a quatro mãos com Tomás Morus.

b) Esse retorno às fontes transformou-o no mais prestigiado editor dos clássicos de seu tem­po. Junto com seus dois impressores Aldo Manúcio (Veneza) e J. Froben (Basiléia), prepa­rou, revisou, fez o prólogo de edições de Cícero, Suetônio, Tito Lívio, Plínio, Aristóteles, Demóstenes e Ptolomeu, além das já menciona­das. Para a compreensão e estudo dos clássicos, escreveu várias de suas primeiras obras, como o Antibarbarorum liber (1494), contra os que fa-lam mal o latim; os Colloquia, para o exercício do latim (1495); os Adagia (1500); e, ao final de seus dias, Ciceronianus (1527).

c) Essa preocupação pelas fontes levou-o ao estudo dos documentos da Bíblia, particularmen­te o Novo Testamento, e da tradição cristã, refle­tida nos escritos dos padres. Já em 1516 publicou o Novum Instrumentum ou Novum Testamentum: uma edição bilíngüe — grego e latim — do NT. Dos textos gregos fez sua própria versão latina, resultado de um confronto com os textos mais confiáveis.

Junto a esse estudo da Bíblia, citamos a série de estudos, comentários e edições dos padres, principalmente de *Jerônimo, João *Crisóstomo, *Cipriano, *Agostinho etc.

d) Sua atividade literária não se encerrou aqui. Ao longo de sua vida, junto às edições de clássi­cos greco-latinos e cristãos, sucedeu-se uma sé­rie de obras nas quais apareceu o chamado erasmismo. Com seus livros, dirigiu-se às diver­sas classes e condições sociais de seu tempo — crianças, casais, príncipes, papas, cristãos em ge­ral —, aos quais transmitiu uma nova forma de educação cristã e humana. Nesta linha estão De civilitate morum puerilium (1526); Declamatio de pueris statim ac libenter instituendis (1529); Institutio Christiani Matrimonii (1526); Vidua Christiana (1529). Estes foram precedidos por obras mais conhecidas como o Enchyridium Militis Christiani (1503); o Encomium stultitiae

— Elogio da loucura — (1511), e Institutio Principis Christiani (1516).

e) A atividade literária de Erasmo dirigiu-se, finalmente, para os problemas políticos e religio­sos de seu tempo. Odiou visceralmente a guerra, que para ele era antimoral e anti-evangélica, se-jam guerras internacionais, sedições ou guerras civis. A paz, ao contrário, era um fim em si mes­mo que se deve conseguir a qualquer custo. Em todas as suas obras volta a esse tema da paz e da guerra como um obsessão. O Evangelho é uma mensagem de paz, a guerra é o anti-Evangelho. Por isso escreveu seus dois livros sobre a paz con­tra as guerras de Júlio II: Julius exclusus e coelis (1513) e em especial o Querella pacis (1516).

f) A situação religiosa, todavia, causou-lhe maior preocupação. Para ele, a Igreja de seu tem­po apresentou a distopia: a corrupção e a desor­dem máxima na hierarquia eclesiástica, as ordens religiosas, os reis e príncipes que se diziam cris­tãos. A experiência de uma Igreja e de uma soci­edade afastadas do ideal do cristão fará com que ele deixe as palestras para lançar-se contra papas, bispos, abades e clérigos que desmentiam em sua pessoa e em seu ofício o nome e o ideal de cris­tãos. Sua correspondência epistolar e suas obras pediram e prepararam uma reforma da Igreja in capite et in corpore. Lutero verá nele um de seus mais fortes aliados, mas perceberá também de quanto se diferenciava dele na sua maneira de entender a reforma cristã.

 

 

 

�.                 Que nos resta de Erasmo? Evidentemente, Erasmo não é um teólogo profundo nem um reformador social radical. Seu pensamento reli­gioso segue uma linha de evolução que o leva a amadurecer, em uma cada vez mais meditada or­todoxia.

�.                 Fica para nós sua radical sinceridade que o leva a detestar o farisaísmo. Esse homem parado­xal e polêmico amou e defendeu a pura espiritualidade do cristianismo. Sua philosophia Christi, baseada na Christi sodalitas, tem um con­teúdo profundo capaz para armar o cristianismo e defender-se de seus inimigos. Advoga por uma religião de conversão interior, de retorno à Escri­tura e aos padr,es, assim como de exigência, de harmonia social e de paz entre as nações.

�.                 Deixa-nos sua crítica à sociedade e à Igre­ja, principalmente no Elogio da loucura. “A pu­blicação da Moria — diz Bataillon —tão agres­siva, sob o véu da ironia, contra tudo o que pare-cia morto no catolicismo, põe Erasmo na vanguar­da dos inovadores.” Esse livro representa um novo estilo e um novo modo de compreensão das idéi­as. Através da sátira aos soldados, mercadores, príncipes, sábios, teólogos, monges e prelados, conduz-nos ao paradoxo de uma sabedoria mais elevada: a sabedoria cristã.

�.                 Permanece, finalmente, a “excepcional efi­cácia dos livros de Erasmo. Carregado com os tesouros da Antigüidade cristã e com tudo o que a cristandade poderia reivindicar da herança greco-romana, Erasmo soube administrar esses bens com surpreendente consciência das necessi­dades do mundo moderno. Falou a esse mundo com a linguagem familiar; séria o necessário para seduzi-lo. Foi sábio e edificante, refinado e po­pular” (Bataillon).

�.                 Para a Espanha, concretamente, Erasmo “gozará de maior crédito intelectual entre os es­panhóis do que em nenhum outro povo europeu” (J. L. Abellán). Foi ao mesmo tempo iluminação e progresso das luzes. Ofereceu à Espanha o que tem de mais íntimo e universal. Enriqueceu o seu patrimônio de forma imperecedoura” (Bataillon).

BIBLIOGRAFIA: Opera. Leyden 1703-1706, 11 vols.; reimpressão em Hildesheim 1961-1962; Opus epistolarum. Oxford 1906s., 9 vols.; Obras escogidas. Tradução, comen­tários e notas de L. Riber. Madrid 31971; Elogio de la locura. Tradução de Pedro R. Santidrián. Madrid 31985; M. Bataillon, Erasmo en España. México 21966. 

 

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